27/11/2011

A QUEDA QUE SE TRANSFORMOU EM DANÇA CLÁSSICA

 Façamos da interrupção um caminho novo.
 Da queda um passo de dança.
                                                - Fernando Sabino         




  A queda, que se transformou em dança clássica, aconteceu na convenção estadual da Associação Cultural Nova Acrópole, realizada em Caxias do Sul, nos dias 24 e 25/09/2011, no hotel Samuara, localizado no meio do mato, junto à natureza.
           Foram dois dias inesquecíveis. Dias únicos, onde a água, a terra, o ar e o sol se harmonizaram para embelezar nosso encontro. Um acontecimento ímpar, que conteve, inclusive, palestras de alto nível, conduzidas num clima de descontração, amizade e alegria. O que serviu, com certeza, para fortalecer nossos ideais acropolitanos.
           A organização do evento foi uma lição de boa ordem, com destaque para as apresentações artísticas, onde nossa delegação brilhou com as participações talentosas de nossos poetas, músicos, cantores, declamadores e... dançarinos. Um sucesso!
          Não menos brilhante foi, também, o show particular que assistimos, em circunstâncias meramente casuais. Pois o acaso, por vezes, nos proporciona um espetáculo pitoresco, encantador. E foi o que aconteceu naquela tarde linda, enquanto aguardávamos a chegada do ônibus que nos traria de volta para São Leopoldo.
          Uns acreditam que tudo começou com uma queda. E que a protagonista, ao cair,  conseguiu disfarçar o incidente com muita habilidade, transformando-o em uma dança clássica. Outros já dizem que foi uma apresentação espontânea, realizada por quem conhece perfeitamente as técnicas e os movimentos básicos do balé clássico.
          O cenário não poderia ser melhor. No fundo, o mato denso. Em cima, sobre as árvores mais altas, o amarelo do sol resplandecendo, sob um azul-celeste profundo e calmo. À nossa frente, um palco verde formado por uma grama bem cuidada. E foi ali, justamente ali, que, sem que ninguém esperasse, surgiu, subindo a escadaria que divide o mato com o pátio, aquela jovem elegantemente vestida. Vinha sem pressa, aparecendo aos poucos para a platéia.  Súbito, a queda! Justo quando ela vencia o último degrau da escadaria. Cai de corpo inteiro no gramado e parece ficar desmaiada. Já nos preparávamos para socorrê-la quando, de repente, nossa “Bela Adormecida” desperta. Levanta-se e, com a maior naturalidade, entra em cena dando seqüência aos movimentos de braços e pernas que fez quando tocou o chão.
          Mesmo sem uma orquestra musical materializada, lá vinha ela dançando em nossa direção, alternando movimentos bruscos e suaves, cheia de sutilezas e musicalidade, elegância e graça, marcando, com a ginga do corpo, o compasso de uma música imaginária.
          Quando chegou até nós perguntou, entre apreensiva e divertida:
           - Vocês viram?
           - Gostei, foi muito lindo, comentou a Madalena.
           - E tu, Valéria, viste?
           - Adorei
           - E tu, Aderbal?
           - Não vi nada.
           - A Marici nem esperou que a pergunta lhe fosse dirigida:
           - Eu vi. Vi tudo!
           - Como assim?
           Numa demonstração de que sabe tudo sobre dança, a Marici, com aqueles olhos atentos que tudo vê e tudo registra, foi logo dando detalhes da coreografia:
          - Foste de uma leveza incrível; de uma técnica muito apurada; de movimentos acrobáticos hábeis e precisos. Tua espontaneidade de gestos foi surpreendente! Conseguiste o máximo em autodisciplina e harmonia. Foi uma bela apresentação!  Meus parabéns.
          E a turma aplaudiu a bailarina. No entanto, restou uma dúvida. Ninguém da platéia questionou sobre o aprendizado daquela dança. Por que somente agora ela nos dava a conhecer esse seu lado artístico maravilhoso? Eu, por exemplo, nunca ouvi falar que a nossa queridíssima Renatinha Cruz fosse uma bailarina de música clássica. Por isso, sou tentado a acreditar que o susto, ocasionado pela queda, foi tão grande – potencializado pelo receio de ter que pagar um mico diante dos colegas acropolitanos - que ela, fulminada pelo terror, conseguiu desarquivar, do fundo da alma, uma experiência distante, de vidas passadas, e demonstrar, inconscientemente, a exímia bailarina que foi. Disfarçando, assim, o seu tombo. E se isso aconteceu, aí sim poderemos dizer, sem medo de errar, que ela teve muita “presença de espírito.”




Por Aderbal Farias Saldanha.

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